'Estranho olhar esta casa vazia... Mesmo depois de tudo! Sem móveis nem
cortinas; as paredes, agora brancas, são como folhas de papel que pedem
para ser preenchidas. Me inspiram a escrever minha história. Parte dela
se passou aqui! Se você só acredita no material, no físico e palpável,
não se dê ao trabalho de lê-la. Só prossiga se, como eu, acreditar que o
mundo é muito maior do que compreendemos e o amor pode ir além do
"normal". Aí, talvez, você entenda como me sinto e, quem sabe, até tenha
passado por isso antes - e só não contou por receio de parecer maluca.
Pois bem: não tenho esse medo!
Meu nome é Shirley, e hoje eu vou te contar a minha história, ela começa no friorento junho de 1995. Quando eu acabara de completar 15 anos e estreava meu lindo casaco de lã rosa na escola. Aproveitei o intervalo para exibi-lo. Em meio ao animado papo com as meninas, notei um gato me olhando lá do outro lado do ginásio. Nunca vira aquele moço alto, magro, de cabelos cacheados. Cercado de colegas, parecia se divertir muito. "Shirley, viu fantasma?!", brincou uma das meninas. Sorri, envergonhada, e todas notaram o foco da minha atenção. "Ah, está de olho no Ricardo... Acabou de ser transferido para cá. A prima dele estuda comigo, me contou tudo", entregou Laudecir, "fofoqueira número um" do colégio.
O dito-cujo também notou meu interesse. Fez cara de sem-vergonha e me deu a maior secada. Tremi feito vara verde. Disse algo aos amigos e veio na minha direção. "Lau, o que eu faço?!", sussurrei, em pânico. Minhas amigas piscaram umas para as outras. Decidi sair correndo direto para a sala de aula vazia. Sentei na minha carteira, o coração saltando pela boca. Jamais sentira nada parecido.
O sinal bateu, todos voltaram para a classe. Laudecir chegou bronqueada: "Sua maluca! O bonitão veio falar com você e a senhorita fugiu feito o diabo da cruz. Pirou?". Eu não sabia onde enfiar a cabeça. Ainda era virgem e inexperiente com rapazes. Aquela situação me fez virar uma medrosa de carteirinha. "Ah, ele deixou isso aqui...", murmurou Nina, esticando um bilhetinho para mim. Corada, me afastei delas para ler o papel. "Da próxima vez, não precisa fugir: eu não mordo. Do seu amigo, Ricardo".
Meu nome é Shirley, e hoje eu vou te contar a minha história, ela começa no friorento junho de 1995. Quando eu acabara de completar 15 anos e estreava meu lindo casaco de lã rosa na escola. Aproveitei o intervalo para exibi-lo. Em meio ao animado papo com as meninas, notei um gato me olhando lá do outro lado do ginásio. Nunca vira aquele moço alto, magro, de cabelos cacheados. Cercado de colegas, parecia se divertir muito. "Shirley, viu fantasma?!", brincou uma das meninas. Sorri, envergonhada, e todas notaram o foco da minha atenção. "Ah, está de olho no Ricardo... Acabou de ser transferido para cá. A prima dele estuda comigo, me contou tudo", entregou Laudecir, "fofoqueira número um" do colégio.
O dito-cujo também notou meu interesse. Fez cara de sem-vergonha e me deu a maior secada. Tremi feito vara verde. Disse algo aos amigos e veio na minha direção. "Lau, o que eu faço?!", sussurrei, em pânico. Minhas amigas piscaram umas para as outras. Decidi sair correndo direto para a sala de aula vazia. Sentei na minha carteira, o coração saltando pela boca. Jamais sentira nada parecido.
O sinal bateu, todos voltaram para a classe. Laudecir chegou bronqueada: "Sua maluca! O bonitão veio falar com você e a senhorita fugiu feito o diabo da cruz. Pirou?". Eu não sabia onde enfiar a cabeça. Ainda era virgem e inexperiente com rapazes. Aquela situação me fez virar uma medrosa de carteirinha. "Ah, ele deixou isso aqui...", murmurou Nina, esticando um bilhetinho para mim. Corada, me afastei delas para ler o papel. "Da próxima vez, não precisa fugir: eu não mordo. Do seu amigo, Ricardo".
Após uma noite maldormida, tomei a decisão: iria falar com ele. Mesmo com medo de ganhar fama de vagabunda, iria ver o que ele queria. Sentia-me determinada e nada me impediria. O máximo que poderia acontecer era o cara só querer amizade. E eu entenderia. Quer dizer, ACHO que compreenderia.
Pensando em tudo, menos em estudar, caprichei na maquiagem ao ir para a escola. A professora de matemática me chamou a atenção umas seis vezes: "Você não está nem aí hoje, hein?!". Minhas amigas riam, pois sabiam onde estava com a cabeça.
Finalmente, chegou o intervalo. Disparei para a cantina. Pedi um lanche e um suco e fiquei fazendo hora. Discretamente, olhava para os arredores, procurando meu príncipe encantado. E não demorou para que eu o enxergasse: abraçado a uma loira peituda, metida numa saia que mal cabia nela e, ainda por cima, com a maior cara de safada. Na certa, eu havia chegado tarde demais!
Voltei chorando para a sala de aula. "Homens são todos iguais. E as
vagabundas também!", resmunguei. Nisso, me dei conta que estava sendo
observada. "Oi", disse Ricardo. Tomei o maior susto, mas encarei-o.
Brava. "Shirley, corri atrás de você, mas acho que não percebeu...",
continuou. "Olá, mas quem é você?", interrompi, fingindo nunca tê-lo
notado na vida. Ele sabia que eu estava mentindo. Pelo seu olhar, tive
certeza que Ricardo tinha noção de quanto eu o desejava. "Bem, sou o
cara com quem você trocou uns olhares outro dia. E, só para esclarecer, a
garota loira que estava comigo é minha prima. Ela estuda na sala ao
lado!", disse, como se estivesse prestando contas. De fato, estava.
Senti-me, ao mesmo tempo, aliviada e envergonhada. A moça era da família dele, não uma namoradinha. Mesmo assim, não pude dar o braço a torcer. "Que garota?! Nem vi...", murmurei, já esboçando um sorriso sem-graça. Desfeito o mal-entendido, começamos a papear. Ele disse que trabalhava na oficina de carros do pai; adorava jogar futebol. Eu contei que ajudava mamãe a fazer salgados e que amava dançar e ouvir música sertaneja, daquelas bem românticas. O súbito sinal da aula cortou nosso clima.
"Bem, a gente se vê no intervalo amanhã. Pode ser?", sugeriu ele, já bem à vontade comigo. Abri um sorrisão e o moço entendeu a resposta. Laudecir, que observava tudo da porta, grudou em mim assim que Ricardo se foi. "Shirley, me conte tudo...", sussurrou curiosa. Relatei os acontecimentos e minha amiga ficou mais maluca. Parecia até que era ela quem estava flertando com o gato. "Lau, ele é lindo, inteligente, trabalhador e carinhoso. Mas sou muito desconfiada. Por isso, irei com toda a calma", ponderei, tentando parecer madura. Por dentro, meu discurso era outro: queria assumir o quanto estava morrendo de vontade de beijar aquele rapaz na boca e de me entregar para ele.
As aulas de biologia, inglês e matemática do dia seguinte demoraram uma eternidade. A todo o momento eu olhava para o relógio, ansiosa pelo intervalo. Finalmente, o estridente sinal tocou. Corri para o pátio como se fugisse de alguém. Na verdade, estava: tentava escapar da minha solidão de adolescente tímida. Naquele momento, enxergava em Ricardo um portal para que eu pudesse crescer e amar como todas as mulheres fazem.
Com todos esses pensamentos malucos na cabeça, surgi na frente dele. "Você está uma gata", disse, assim que me viu. Sorri. Ele retribuiu. Notei que algo estava errado. "Tem um pouco de batom nos seus dentes...", brincou. Senti o rosto queimar de tão vermelha que fiquei, de vergonha. Havia exagerado na maquiagem para impressioná-lo sem saber usá-la direito. "Posso limpar para você?", insistiu, erguendo meu queixo cabisbaixo com seus dedos. Eu não entendi bem a pergunta, mas disse sim, sem pensar muito. O gato se aproximou e me deu nosso primeiro beijo. Senti sua língua passar pela minha boca inteira, inclusive pelos meus dentes. Quando nos separamos não existia mais nenhum resquício de batom em meus dentes. E não havia mais nenhum vestígio de solidão em meu coração.
Senti-me, ao mesmo tempo, aliviada e envergonhada. A moça era da família dele, não uma namoradinha. Mesmo assim, não pude dar o braço a torcer. "Que garota?! Nem vi...", murmurei, já esboçando um sorriso sem-graça. Desfeito o mal-entendido, começamos a papear. Ele disse que trabalhava na oficina de carros do pai; adorava jogar futebol. Eu contei que ajudava mamãe a fazer salgados e que amava dançar e ouvir música sertaneja, daquelas bem românticas. O súbito sinal da aula cortou nosso clima.
"Bem, a gente se vê no intervalo amanhã. Pode ser?", sugeriu ele, já bem à vontade comigo. Abri um sorrisão e o moço entendeu a resposta. Laudecir, que observava tudo da porta, grudou em mim assim que Ricardo se foi. "Shirley, me conte tudo...", sussurrou curiosa. Relatei os acontecimentos e minha amiga ficou mais maluca. Parecia até que era ela quem estava flertando com o gato. "Lau, ele é lindo, inteligente, trabalhador e carinhoso. Mas sou muito desconfiada. Por isso, irei com toda a calma", ponderei, tentando parecer madura. Por dentro, meu discurso era outro: queria assumir o quanto estava morrendo de vontade de beijar aquele rapaz na boca e de me entregar para ele.
As aulas de biologia, inglês e matemática do dia seguinte demoraram uma eternidade. A todo o momento eu olhava para o relógio, ansiosa pelo intervalo. Finalmente, o estridente sinal tocou. Corri para o pátio como se fugisse de alguém. Na verdade, estava: tentava escapar da minha solidão de adolescente tímida. Naquele momento, enxergava em Ricardo um portal para que eu pudesse crescer e amar como todas as mulheres fazem.
Com todos esses pensamentos malucos na cabeça, surgi na frente dele. "Você está uma gata", disse, assim que me viu. Sorri. Ele retribuiu. Notei que algo estava errado. "Tem um pouco de batom nos seus dentes...", brincou. Senti o rosto queimar de tão vermelha que fiquei, de vergonha. Havia exagerado na maquiagem para impressioná-lo sem saber usá-la direito. "Posso limpar para você?", insistiu, erguendo meu queixo cabisbaixo com seus dedos. Eu não entendi bem a pergunta, mas disse sim, sem pensar muito. O gato se aproximou e me deu nosso primeiro beijo. Senti sua língua passar pela minha boca inteira, inclusive pelos meus dentes. Quando nos separamos não existia mais nenhum resquício de batom em meus dentes. E não havia mais nenhum vestígio de solidão em meu coração.
Eu e Ricardo passamos a namorar. Andávamos de mãos dadas pelo colégio,
trocávamos beijos no pátio... Foi assim durante um ano. "Posso ir à sua
casa conhecer seus pais?", perguntou ele, um dia. Ri, nervosa. "Será que
vai pedir minha mão?", pensei. Como se lesse pensamento, o gato
prosseguiu: "Acho legal me conhecerem para abençoar nosso namoro...".
Meus pais não sabiam que eu saía com ele. Por ser o primeiro homem da minha vida, tinha o maior medo de revelar o caso e pôr tudo a perder. Consultei Laudecir e outras colegas. "Vocês nem transaram ainda! Que mal há em contar, Shirley?", avaliou uma delas.
Decidi falar com meus pais. Pelo jeito que me sentia, parecia que estava prestes a revelar que era uma criminosa. "Estou namorando...", murmurei na mesa de jantar. Papai me lançou um olhar sério; mamãe apenas suspirou. Ela já devia ter passado por isso em algum momento da vida dela. "Esse moço é de família?", perguntou a dona da casa. Fiz que sim com a cabeça. Após muito questionamento, mamãe fez a pergunta derradeira, enquanto lavávamos a louça: "Você ainda é virgem?". Fiquei vermelha e contei a verdade. "Sim, a gente só se beija!".
Quando falei para Ricardo que estava autorizado a conhecer minha família, ele me pareceu mesmo emocionado. "Puxa, que bom que irei na casa da mulher da minha vida e da futura mãe dos meus filhos..." No sábado seguinte, chegou com flores e uma garrafa de uísque na mão. Lógico que todos o adoraram! Por que não iriam gostar de uma criatura tão doce como o meu amado?
Nosso terceiro ano de namoro coincidiu com meu aniversário de 18 anos. Muuuita coisa havia acontecido, menos aquilo que mamãe tanto temia. Como recompensa, meus pais permitiram que nós viajássemos juntos. Com a companhia das minhas amigas, claro. Já no primeiro dia, nós dois decidimos fazer uma caminhada pelo campo que rodeava o sítio onde estávamos. Assim que vimos uma linda cachoeira, ele olhou para mim. "Tudo bem se eu der um mergulho?", perguntou. Eu sorri. Então, ele tirou a roupa e ficou só de sunga. Ou seja, o danado já previa que aquilo fosse acontecer.
"Não trouxe biquíni...", disse, envergonhada. "Eu não vou achar nada ruim se tiver que vê-la de lingerie!", devolveu o sem-vergonha. Meus hormônios falaram mais alto que minha consciência e, por fim, me juntei a ele. Dentro da água fria, nós nos abraçamos. Ricardo estava tão excitado que a sunga mal podia comportar seu enorme desejo.(rs.rs...)Entre beijos molhados e carícias, deixei que me possuísse ali, na cachoeira. Não senti dor nem pudor. Parecia que havia me preparado a vida toda para aquele momento.
Assim que saímos da água, ele me entregou um anel de prata. "Ganhei uma gorjeta por causa de uma moto que consertei e resolvi comprar isto para você", disse. Enquanto eu chorava de emoção, vi um filme passar pela minha cabeça: casamento, filhos e uma velhice feliz ao lado dele. Tudo parecia tão perfeito que tinha medo de estar apenas sonhando. E - ah, as ironias da vida - eu talvez estivesse mesmo...
Meus pais não sabiam que eu saía com ele. Por ser o primeiro homem da minha vida, tinha o maior medo de revelar o caso e pôr tudo a perder. Consultei Laudecir e outras colegas. "Vocês nem transaram ainda! Que mal há em contar, Shirley?", avaliou uma delas.
Decidi falar com meus pais. Pelo jeito que me sentia, parecia que estava prestes a revelar que era uma criminosa. "Estou namorando...", murmurei na mesa de jantar. Papai me lançou um olhar sério; mamãe apenas suspirou. Ela já devia ter passado por isso em algum momento da vida dela. "Esse moço é de família?", perguntou a dona da casa. Fiz que sim com a cabeça. Após muito questionamento, mamãe fez a pergunta derradeira, enquanto lavávamos a louça: "Você ainda é virgem?". Fiquei vermelha e contei a verdade. "Sim, a gente só se beija!".
Quando falei para Ricardo que estava autorizado a conhecer minha família, ele me pareceu mesmo emocionado. "Puxa, que bom que irei na casa da mulher da minha vida e da futura mãe dos meus filhos..." No sábado seguinte, chegou com flores e uma garrafa de uísque na mão. Lógico que todos o adoraram! Por que não iriam gostar de uma criatura tão doce como o meu amado?
Nosso terceiro ano de namoro coincidiu com meu aniversário de 18 anos. Muuuita coisa havia acontecido, menos aquilo que mamãe tanto temia. Como recompensa, meus pais permitiram que nós viajássemos juntos. Com a companhia das minhas amigas, claro. Já no primeiro dia, nós dois decidimos fazer uma caminhada pelo campo que rodeava o sítio onde estávamos. Assim que vimos uma linda cachoeira, ele olhou para mim. "Tudo bem se eu der um mergulho?", perguntou. Eu sorri. Então, ele tirou a roupa e ficou só de sunga. Ou seja, o danado já previa que aquilo fosse acontecer.
"Não trouxe biquíni...", disse, envergonhada. "Eu não vou achar nada ruim se tiver que vê-la de lingerie!", devolveu o sem-vergonha. Meus hormônios falaram mais alto que minha consciência e, por fim, me juntei a ele. Dentro da água fria, nós nos abraçamos. Ricardo estava tão excitado que a sunga mal podia comportar seu enorme desejo.(rs.rs...)Entre beijos molhados e carícias, deixei que me possuísse ali, na cachoeira. Não senti dor nem pudor. Parecia que havia me preparado a vida toda para aquele momento.
Assim que saímos da água, ele me entregou um anel de prata. "Ganhei uma gorjeta por causa de uma moto que consertei e resolvi comprar isto para você", disse. Enquanto eu chorava de emoção, vi um filme passar pela minha cabeça: casamento, filhos e uma velhice feliz ao lado dele. Tudo parecia tão perfeito que tinha medo de estar apenas sonhando. E - ah, as ironias da vida - eu talvez estivesse mesmo...
Em três anos nos casamos. A cerimônia foi muito simples, no sítio de um
amigo de Ricardo. Enquanto fazíamos os votos de "felizes para sempre",
pássaros gorjeavam e um delicioso vento soprava. Tudo como sempre
sonháramos. Assim que o padre nos declarou marido e mulher, trocamos
beijos ardentes, sob aplausos de familiares e colegas.
"Shirley, este é o dia mais importante da minha vida!", sussurrou Ricardo no meio de toda aquela farra. Eu, claro, disse o mesmo e pensei no convidado mais importante da noite que, curiosamente, não estava ao alcance dos nossos olhos, mas, sim, dentro de mim. Sim, eu estava grávida de um mês. "Nosso filho poderá contar aos amiguinhos que esteve no casório dos pais", brincou meu marido.
Só havia revelado a novidade para meus pais e para Laudecir. Queria deixar a gravidez evoluir direitinho antes de espalhar a boa-nova. "Quando este casal tão abençoado terá herdeiros?", quis saber uma tia. Sorri e alisei discretamente a barriga. "Quando Deus quiser, tia", devolvi sem ela perceber que eu já havia lhe dado a resposta.
Quando já estava no terceiro mês de gestação, contei para todo mundo. Ricardo, orgulhoso como nunca, ficou ainda mais exultante ao descobrir, no exame de ultrassom, que seria um menino. "O Ricardinho está chegando...", falava a todo o momento. Parecia uma criança, tamanha animação. "Assim que ele nascer, vamos sair desse apartamento e nos mudar para uma casa", anunciou, certa vez. Ele já não era mais funcionário da oficina de seu pai, mas o dono do estabelecimento. Trabalhador até não poder mais, havia conseguido melhorar os negócios da família e, graças a Deus, agora tinha condições de nos dar uma vida confortável e segura.
No quinto mês de gravidez, sua profecia se concretizou. Passamos a morar numa enorme casa de dois quartos. Ele mesmo pintou de azul o cantinho do nosso filho. "O moleque vai dormir num quarto bem bonito", falou, ao terminar sua obra-prima. Nos meses seguintes, vivi emoções inesquecíveis com meu homem: quase todas as noites nos amávamos e trocávamos juras de amor. Fizemos muitos jantares românticos e planos para o futuro. Um deles incluía até "encomendar" uma irmãzinha para Ricardinho.
No oitavo mês de gestação decidimos fazer uma viagem romântica para a praia. "Será a nossa última chance de ficar a sós antes de o bebê chegar", comentou meu amado, enquanto guardava a bagagem no carro. Durante o percurso, no meio da sinuosa serra, colocou para tocar As Flores do Jardim da Nossa Casa, de Roberto Carlos, minha canção favorita.
Sempre que eu estava mexendo na roseira de nosso quintal, ele tocava essa música para mim. Eu me emocionei. Ele também. Gentil, levou suas mãos aos meus olhos para enxugar minhas lágrimas e inclinou seu rosto para me dar um beijo. Derrepente! Um caminhão que vinha na direção contrária da pista não notou que havia saído de sua faixa. Antes que meus lábios tocassem os de Ricardo, ele se chocou em cheio com o nosso veículo, nos atirando para um barranco. Eu sobrevivi. Mas, tanto meu bebê como meu amor, não!
"Shirley, este é o dia mais importante da minha vida!", sussurrou Ricardo no meio de toda aquela farra. Eu, claro, disse o mesmo e pensei no convidado mais importante da noite que, curiosamente, não estava ao alcance dos nossos olhos, mas, sim, dentro de mim. Sim, eu estava grávida de um mês. "Nosso filho poderá contar aos amiguinhos que esteve no casório dos pais", brincou meu marido.
Só havia revelado a novidade para meus pais e para Laudecir. Queria deixar a gravidez evoluir direitinho antes de espalhar a boa-nova. "Quando este casal tão abençoado terá herdeiros?", quis saber uma tia. Sorri e alisei discretamente a barriga. "Quando Deus quiser, tia", devolvi sem ela perceber que eu já havia lhe dado a resposta.
Quando já estava no terceiro mês de gestação, contei para todo mundo. Ricardo, orgulhoso como nunca, ficou ainda mais exultante ao descobrir, no exame de ultrassom, que seria um menino. "O Ricardinho está chegando...", falava a todo o momento. Parecia uma criança, tamanha animação. "Assim que ele nascer, vamos sair desse apartamento e nos mudar para uma casa", anunciou, certa vez. Ele já não era mais funcionário da oficina de seu pai, mas o dono do estabelecimento. Trabalhador até não poder mais, havia conseguido melhorar os negócios da família e, graças a Deus, agora tinha condições de nos dar uma vida confortável e segura.
No quinto mês de gravidez, sua profecia se concretizou. Passamos a morar numa enorme casa de dois quartos. Ele mesmo pintou de azul o cantinho do nosso filho. "O moleque vai dormir num quarto bem bonito", falou, ao terminar sua obra-prima. Nos meses seguintes, vivi emoções inesquecíveis com meu homem: quase todas as noites nos amávamos e trocávamos juras de amor. Fizemos muitos jantares românticos e planos para o futuro. Um deles incluía até "encomendar" uma irmãzinha para Ricardinho.
No oitavo mês de gestação decidimos fazer uma viagem romântica para a praia. "Será a nossa última chance de ficar a sós antes de o bebê chegar", comentou meu amado, enquanto guardava a bagagem no carro. Durante o percurso, no meio da sinuosa serra, colocou para tocar As Flores do Jardim da Nossa Casa, de Roberto Carlos, minha canção favorita.
Sempre que eu estava mexendo na roseira de nosso quintal, ele tocava essa música para mim. Eu me emocionei. Ele também. Gentil, levou suas mãos aos meus olhos para enxugar minhas lágrimas e inclinou seu rosto para me dar um beijo. Derrepente! Um caminhão que vinha na direção contrária da pista não notou que havia saído de sua faixa. Antes que meus lábios tocassem os de Ricardo, ele se chocou em cheio com o nosso veículo, nos atirando para um barranco. Eu sobrevivi. Mas, tanto meu bebê como meu amor, não!
Tique-taque, vrum, tique-taque, vrum... Aqueles ruídos estranhos
ressoavam sem parar nos meus ouvidos. De onde vinham? Onde eu estava?
Sentia meu corpo dolorido, fraco. Tentei abrir os olhos, mas não
consegui. Voltei a dormir profundamente. Não sei quanto tempo se passou
até que eu acordasse.
"Shirley, você está bem?", foi a primeira coisa que eu escutei. Mamãe estava ao lado da minha cama, no hospital. Acariciava minhas mãos, cheias de arranhões e hematomas. Só tive forças para murmurar: "Cadê o Ricardo?!". Ela olhou para meu pai, do outro lado do leito, e abaixou a cabeça. Ainda em estado de choque, levei as mãos até minha barriga. Mamãe abaixou a cabeça novamente.
Naquele instante, preferi morrer. Não enxerguei dentro de mim nenhum sentido para continuar viva. As duas coisas que mais amava haviam partido: meu marido e meu bebê. De uma hora para outra, a mulher feliz e prestes a ter uma família havia se tornado uma pessoa solitária e vazia. Laudecir, que logo reconheci no quarto, aproximou um lenço dos meus olhos para enxugar minhas lágrimas de dor. Encarei-a por algum tempo. Então, senti as pálpebras pesarem novamente. O sedativo estava fazendo efeito.
Até o dia em que recebi alta, não consegui pronunciar uma palavra. Não tinha vontade. Só me alimentava porque meus pais insistiam. Do contrário, teria virado um vegetal. Cheia de olheiras e com as feridas mais profundas que um coração pode suportar, deixei o hospital. Em vez de ir para minha casa, segui para a de papai e mamãe. Lá, fiquei duas semanas deitada, chorando e querendo ter morrido também.
Certa noite, estava no meu quarto de solteira, apática e triste, quando mamãe entrou. Ela pegou minha mão: "Filha, você está viva e precisa agradecer por isso. Não se entregue, Shirley". Encontrei nela mais do que apenas uma mãe, mas uma amiga - aliás, a melhor de todas. Nós nos abraçamos e choramos. Ela tinha razão: eu deveria reagir.
Minha primeira atitude foi voltar para casa. Preferi ir sozinha. Ao olhá-la do lado de fora, parecia que tudo estava igual. O jardim bem cuidado, a pintura recente impecável e o ar gostoso da vizinhança. Mas aquilo só me deixava pior. Ao abrir a porta, senti meu corpo tremer. Observei lentamente cada cômodo e caminhei até o quarto de Ricardinho, onde desabei num choro profundo. Peguei o ursinho de pelúcia que havia comprado para ele e comecei a niná-lo, exatamente como gostaria de ter feito com meu herdeiro.
Arrastei-me até meu quarto. Abri o guarda-roupa de Ricardo e comecei a acariciar suas roupas. Senti o cheiro do meu homem em cada peça, como se ele ainda estivesse ali, vivo. De repente, me vi sozinha, no meio de uma casa ampla e com o coração apertado. Abraçada ao brinquedo do meu filho e às roupas do meu marido, não enxergava como seria meu dia seguinte. Mesmo assim, decidi voltar a morar lá e enfrentar a realidade. E, por mais estranho que pareça, ao tomar essa decisão, ouvi uma voz masculina dizer "estarei sempre ao seu lado", num timbre que me era tão familiar!
"Shirley, você está bem?", foi a primeira coisa que eu escutei. Mamãe estava ao lado da minha cama, no hospital. Acariciava minhas mãos, cheias de arranhões e hematomas. Só tive forças para murmurar: "Cadê o Ricardo?!". Ela olhou para meu pai, do outro lado do leito, e abaixou a cabeça. Ainda em estado de choque, levei as mãos até minha barriga. Mamãe abaixou a cabeça novamente.
Naquele instante, preferi morrer. Não enxerguei dentro de mim nenhum sentido para continuar viva. As duas coisas que mais amava haviam partido: meu marido e meu bebê. De uma hora para outra, a mulher feliz e prestes a ter uma família havia se tornado uma pessoa solitária e vazia. Laudecir, que logo reconheci no quarto, aproximou um lenço dos meus olhos para enxugar minhas lágrimas de dor. Encarei-a por algum tempo. Então, senti as pálpebras pesarem novamente. O sedativo estava fazendo efeito.
Até o dia em que recebi alta, não consegui pronunciar uma palavra. Não tinha vontade. Só me alimentava porque meus pais insistiam. Do contrário, teria virado um vegetal. Cheia de olheiras e com as feridas mais profundas que um coração pode suportar, deixei o hospital. Em vez de ir para minha casa, segui para a de papai e mamãe. Lá, fiquei duas semanas deitada, chorando e querendo ter morrido também.
Certa noite, estava no meu quarto de solteira, apática e triste, quando mamãe entrou. Ela pegou minha mão: "Filha, você está viva e precisa agradecer por isso. Não se entregue, Shirley". Encontrei nela mais do que apenas uma mãe, mas uma amiga - aliás, a melhor de todas. Nós nos abraçamos e choramos. Ela tinha razão: eu deveria reagir.
Minha primeira atitude foi voltar para casa. Preferi ir sozinha. Ao olhá-la do lado de fora, parecia que tudo estava igual. O jardim bem cuidado, a pintura recente impecável e o ar gostoso da vizinhança. Mas aquilo só me deixava pior. Ao abrir a porta, senti meu corpo tremer. Observei lentamente cada cômodo e caminhei até o quarto de Ricardinho, onde desabei num choro profundo. Peguei o ursinho de pelúcia que havia comprado para ele e comecei a niná-lo, exatamente como gostaria de ter feito com meu herdeiro.
Arrastei-me até meu quarto. Abri o guarda-roupa de Ricardo e comecei a acariciar suas roupas. Senti o cheiro do meu homem em cada peça, como se ele ainda estivesse ali, vivo. De repente, me vi sozinha, no meio de uma casa ampla e com o coração apertado. Abraçada ao brinquedo do meu filho e às roupas do meu marido, não enxergava como seria meu dia seguinte. Mesmo assim, decidi voltar a morar lá e enfrentar a realidade. E, por mais estranho que pareça, ao tomar essa decisão, ouvi uma voz masculina dizer "estarei sempre ao seu lado", num timbre que me era tão familiar!
Após sentir a presença de Ricardo na casa, eu me senti diferente. Era
como se ainda estivesse ali, vivo! "Shirley, você está maluca. Ele
morreu, tudo acabou...", murmurava para mim mesma, tentando não pirar.
Ainda assim, iniciei um ritual diário: sempre que estava em casa,
prestava atenção a qualquer ruído na esperança de meu homem voltar a se
comunicar comigo. "Amor, onde você está?!", gritei muitas vezes no auge
de minha solidão.
Até que, numa noite de terça-feira, meu pedido foi atendido. Mas, em vez de ouvir a voz do meu marido, senti o toque de suas mãos em meus braços, exatamente como ele costumava fazer. Fiquei arrepiada e zonza. "Meu amor...", sussurrei, torcendo para que aquele momento se eternizasse. Um vento frio soprou da janela da sala. "Shirley, você precisa seguir a sua vida...". Ao ouvir aquela frase, comecei a chorar. "Ricardo, não consigo. Não sem você! Por favor, volte!", respondi olhando ao redor, na expectativa de vê-lo.
De repente, o vento parou. A voz sumiu. O arrepio cessou. "Não me abandone...", choraminguei. No dia seguinte, fui ver mamãe. Precisava relatar o que estava acontecendo. Ela ouviu com paciência. Enquanto eu tomava um copo de água com açúcar, fez de tudo para tranquilizar a filha aflita. "Está na hora de deixá-lo em paz. Ricardo já morreu, mas você não! Reconstrua sua vida, Shirley".
Mais uma vez, ela tinha razão. Mas quando você está sofrendo demais, fica surda e não ouve esses conselhos importantes. Foi o que aconteceu comigo. Voltei para casa e continuei chamando pelo nome do meu marido. Passei a madrugada inteira assim, feito maluca. "Deus, por que você permitiu que isso acontecesse comigo?! Por quê?!", repetia.
Passei a não sair de casa e a comer pouco. No fundo, queria morrer, acabar logo com o sofrimento e, sobretudo, reencontrar meu grande amor no plano espiritual. Quando ouvi o toque da campainha naquela manhã chuvosa de sexta-feira, mal tive forças para levantar da cama e ir até a janela. Uma moça com roupas puídas e cabelos desgrenhados estava ao portão. "Bom-dia. A senhora pode ajudar com alguma comida para meus filhos?, perguntou. Fiquei olhando para aquela família carente. Como se acordasse de uma hipnose, pedi um minuto e fui até a cozinha.
Quando entreguei os mantimentos, vi nos olhinhos daqueles pequenos um brilho de agradecimento. Eles poderiam ser meus filhos. Mas não eram. E aquela mulher, apesar de viver em uma condição miserável, estava lutando para sustentá-los, mantê-los vivos. Todos me agradeceram e partiram.
Ao entrar, eu me senti estranha. Como se algo tivesse mudado dentro de mim - e mudado para muito melhor. Até mesmo a casa parecia mais iluminada, arejada. Abri todas as janelas e faxinei cômodo por cômodo. Eu havia ajudado outras pessoas. Era hora de me ajudar também. Se aquela moça lutava tanto pela vida dela e de seus filhos, não era justo que eu me entregasse. A voz familiar que ouvi naquela noite me disse que eu estava no caminho certo. E, dessa vez, não chorei ao escutá-la. Pelo contrário, me senti alegre, de de volta à vida.
Até que, numa noite de terça-feira, meu pedido foi atendido. Mas, em vez de ouvir a voz do meu marido, senti o toque de suas mãos em meus braços, exatamente como ele costumava fazer. Fiquei arrepiada e zonza. "Meu amor...", sussurrei, torcendo para que aquele momento se eternizasse. Um vento frio soprou da janela da sala. "Shirley, você precisa seguir a sua vida...". Ao ouvir aquela frase, comecei a chorar. "Ricardo, não consigo. Não sem você! Por favor, volte!", respondi olhando ao redor, na expectativa de vê-lo.
De repente, o vento parou. A voz sumiu. O arrepio cessou. "Não me abandone...", choraminguei. No dia seguinte, fui ver mamãe. Precisava relatar o que estava acontecendo. Ela ouviu com paciência. Enquanto eu tomava um copo de água com açúcar, fez de tudo para tranquilizar a filha aflita. "Está na hora de deixá-lo em paz. Ricardo já morreu, mas você não! Reconstrua sua vida, Shirley".
Mais uma vez, ela tinha razão. Mas quando você está sofrendo demais, fica surda e não ouve esses conselhos importantes. Foi o que aconteceu comigo. Voltei para casa e continuei chamando pelo nome do meu marido. Passei a madrugada inteira assim, feito maluca. "Deus, por que você permitiu que isso acontecesse comigo?! Por quê?!", repetia.
Passei a não sair de casa e a comer pouco. No fundo, queria morrer, acabar logo com o sofrimento e, sobretudo, reencontrar meu grande amor no plano espiritual. Quando ouvi o toque da campainha naquela manhã chuvosa de sexta-feira, mal tive forças para levantar da cama e ir até a janela. Uma moça com roupas puídas e cabelos desgrenhados estava ao portão. "Bom-dia. A senhora pode ajudar com alguma comida para meus filhos?, perguntou. Fiquei olhando para aquela família carente. Como se acordasse de uma hipnose, pedi um minuto e fui até a cozinha.
Quando entreguei os mantimentos, vi nos olhinhos daqueles pequenos um brilho de agradecimento. Eles poderiam ser meus filhos. Mas não eram. E aquela mulher, apesar de viver em uma condição miserável, estava lutando para sustentá-los, mantê-los vivos. Todos me agradeceram e partiram.
Ao entrar, eu me senti estranha. Como se algo tivesse mudado dentro de mim - e mudado para muito melhor. Até mesmo a casa parecia mais iluminada, arejada. Abri todas as janelas e faxinei cômodo por cômodo. Eu havia ajudado outras pessoas. Era hora de me ajudar também. Se aquela moça lutava tanto pela vida dela e de seus filhos, não era justo que eu me entregasse. A voz familiar que ouvi naquela noite me disse que eu estava no caminho certo. E, dessa vez, não chorei ao escutá-la. Pelo contrário, me senti alegre, de de volta à vida.
Deixei a casa dos meus pais e voltei a morar no meu cantinho. Nas
primeiras noites, confesso, ainda me sentia só. Às vezes, caminhava
pelos cômodos na esperança de ver ou ouvir meu marido. Mas não me sentia
frustrada por não fazer contato algum. Pelo contrário: no fundo, sabia
que ele devia estar em outro lugar, feliz por ver que eu, finalmente,
seguia meu próprio caminho.
Assim, dia após dia, passei a mudar meu comportamento. Pintei a casa, troquei os móveis de lugar e joguei fora tudo o que não me servia mais. A única coisa em que não mexi foi no enorme porta-retratos da sala. Na foto, Ricardo e eu fazíamos pose num passeio pelo parque. O sorriso estampado em nossos rostos denunciava o quanto nos amávamos. Eu jamais me desfaria daquele momento tão importante de nossas vidas. No entanto, prometi a mim mesma que não passaria a eternidade olhando para aquela imagem como se fosse minha única chance de felicidade.
No trabalho, meus colegas também notaram que eu estava diferente. Aos poucos, voltava a ser a mesma Shirley de sempre. Por precaução, todos evitavam qualquer tipo de comentário sobre maridos e namorados perto de mim. "Menina, nós vamos a uma festa no sábado. Não quer ir com a gente?", perguntou-me Samara, uma amiga do escritório. Festas? Eu já nem sabia o que era uma festa... De qualquer forma, antes de recusar o convite, pedi um dia para pensar.
À noite, em casa, fiquei olhando para o retrato. "Ricardo, o que você acha de eu me divertir um pouco?", murmurei. De repente, senti um arrepio na nuca. "É hora de você seguir adiante...", ouvi. Era a voz dele. Eu sabia. Uma lágrima escorreu em meu rosto. "E é hora de eu seguir o meu caminho", concluiu.
Comecei a chorar de verdade, mas não de tristeza. Pela primeira vez em muito tempo, derramei lágrimas de felicidade. Eu sabia que era o momento de libertar Ricardo e de me libertar. Decidi ir à tal festa com o pessoal do trabalho no fim de semana.
No começo, ao ver tanta gente, eu me senti um pouco de lado. Mas, aos poucos,meus colegas me ajudaram a interagir e logo comecei a me divertir também. A música estava muito boa e os comes e bebes também. Encontrei pessoas que não conhecia e troquei muitas ideias com elas. Vez ou outra, notava algum homem me olhando. "Menina, você faz sucesso com a ala masculina, viu?", brincou uma amiga. Sorri amarelo, mas gostei do comentário. Ele fazia eu me sentir viva!
Passei a sair muito mais depois daquela festa. Voltei a ir ao cinema e frequentar reuniões sociais. Meu círculo de amizades se multiplicou. Descobri coisas novas e me interessei por muitas delas. Também comecei, discretamente, a aceitar os flertes que recebia. De vez em quando, retribuía os olhares de quem se interessava por mim. Não tinha pressa de nada. Eu só queria viver e ser feliz.
Cada vez que chegava em casa e via meu retrato com Ricardo sabia o que o sorriso dele na foto significava: que estava muito contente por eu ter seguido minha vida para, quem sabe, encontrá-lo mais adiante e ficarmos juntos para sempre.'
Assim, dia após dia, passei a mudar meu comportamento. Pintei a casa, troquei os móveis de lugar e joguei fora tudo o que não me servia mais. A única coisa em que não mexi foi no enorme porta-retratos da sala. Na foto, Ricardo e eu fazíamos pose num passeio pelo parque. O sorriso estampado em nossos rostos denunciava o quanto nos amávamos. Eu jamais me desfaria daquele momento tão importante de nossas vidas. No entanto, prometi a mim mesma que não passaria a eternidade olhando para aquela imagem como se fosse minha única chance de felicidade.
No trabalho, meus colegas também notaram que eu estava diferente. Aos poucos, voltava a ser a mesma Shirley de sempre. Por precaução, todos evitavam qualquer tipo de comentário sobre maridos e namorados perto de mim. "Menina, nós vamos a uma festa no sábado. Não quer ir com a gente?", perguntou-me Samara, uma amiga do escritório. Festas? Eu já nem sabia o que era uma festa... De qualquer forma, antes de recusar o convite, pedi um dia para pensar.
À noite, em casa, fiquei olhando para o retrato. "Ricardo, o que você acha de eu me divertir um pouco?", murmurei. De repente, senti um arrepio na nuca. "É hora de você seguir adiante...", ouvi. Era a voz dele. Eu sabia. Uma lágrima escorreu em meu rosto. "E é hora de eu seguir o meu caminho", concluiu.
Comecei a chorar de verdade, mas não de tristeza. Pela primeira vez em muito tempo, derramei lágrimas de felicidade. Eu sabia que era o momento de libertar Ricardo e de me libertar. Decidi ir à tal festa com o pessoal do trabalho no fim de semana.
No começo, ao ver tanta gente, eu me senti um pouco de lado. Mas, aos poucos,meus colegas me ajudaram a interagir e logo comecei a me divertir também. A música estava muito boa e os comes e bebes também. Encontrei pessoas que não conhecia e troquei muitas ideias com elas. Vez ou outra, notava algum homem me olhando. "Menina, você faz sucesso com a ala masculina, viu?", brincou uma amiga. Sorri amarelo, mas gostei do comentário. Ele fazia eu me sentir viva!
Passei a sair muito mais depois daquela festa. Voltei a ir ao cinema e frequentar reuniões sociais. Meu círculo de amizades se multiplicou. Descobri coisas novas e me interessei por muitas delas. Também comecei, discretamente, a aceitar os flertes que recebia. De vez em quando, retribuía os olhares de quem se interessava por mim. Não tinha pressa de nada. Eu só queria viver e ser feliz.
Cada vez que chegava em casa e via meu retrato com Ricardo sabia o que o sorriso dele na foto significava: que estava muito contente por eu ter seguido minha vida para, quem sabe, encontrá-lo mais adiante e ficarmos juntos para sempre.'
||THE END||
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