Conto: Escrava da ilusão - Capítulo 7 de 7 (Final)

By | segunda-feira, dezembro 05, 2011 Leave a Comment

Maria vai visitar a mãe e fica feliz ao ver que a grana que mandou serviu para construir um poço. (Capítulo 7 - Final)


'Dei um jeito de me esconder atrás do muro, apavorada, para observar os policiais na frente do hotel. "Meu Deus. Dona Rosa descobriu tudo e mandou a imigração atrás de mim...", murmurava, aos prantos. Finalmente, vi uma mulher surgir na entrada do prédio. Seus cabelos desgrenhados e sua aparência suja me impressionaram. Ela gritava em espanhol, enquanto os guardas a arrastavam. Ouvi as palavras drogas e tráfico serem mencionadas por dois deles. Ufa, eles estavam atrás da traficante - e não da imigrante. 

Esperei a confusão acabar e voltei para meu quarto. Peguei minha mala e segui para o aeroporto, onde teria de aguardar cinco horas até o embarque. Foi a espera mais dolorosa de toda a minha existência. Fiquei de óculos escuros e, se notava algum rosto familiar, ia para o banheiro e me trancava no reservado. Passei quase todo o tempo lá, com medo de ser reconhecida, como se a criminosa fosse eu, e não aquela cafetina desgraçada. 

Finalmente, ouvi o anúncio de meu voo. A cada passo que dava em direção ao portão de embarque, me sentia tonta e amedrontada. Tinha a sensação de que, a qualquer instante, alguém poderia me fazer algo ruim. "Maria!", ouvi alguém gritar. Não tive coragem de olhar para trás. A voz insistiu: "Maria...". Pronto! Meu sonho de voltar havia chegado ao fim. 

Quando olhei na direção da pessoa que gritava, a vi abraçando outra mulher, outra Maria, nome comum em Portugal. Passado o susto, entrei no avião. Sentia-me tranquila e feliz: estava regressando aos meus pais. 

Assim que cheguei a São Paulo fui para a casa onde trabalhava como doméstica. Minha patroa ficou surpresa ao me ver. Decidi contar tudo. Ela se espantou com minha coragem, mas, como uma segunda mãe, também chamou minha atenção. "Você correu risco de morte, Maria. Essa história de tráfico internacional de mulheres sempre acaba em tragédia. É uma tremenda armadilha para garotas inocentes!", falou. Ouvi com respeito. Ela tinha toda a razão. Agora, sabia que a promessa de dançar em boates de países europeus, muitas vezes, pode significar ter, sobretudo, de se prostituir. 

Como ela já havia arrumado outra empregada, me indicou para trabalhar de assistente numa loja de roupas de uma amiga. Eu aceitei, claro. Ganhava bem menos do que em Portugal, mas mantinha minha dignidade intacta. Assim que consegui juntar alguma grana, decidi visitar minha mãe no Nordeste. 

Quando ela me viu chegar, caiu no choro. Eu a abracei, emocionada. Apenas nossa casa simples testemunhou a cena, já que o resto da família estava na roça. Não contei para mamãe sobre meu sofrimento. Disse que tinha pedido demissão porque queria voltar ao Brasil. Ela fingiu acreditar, mas sabia que estava mentindo. 

"Ali é o poço que a gente construiu com o dinheiro que você mandou, filha", falou. Senti-me compensada: meu sacrifício tinha servido para alguma coisa. Mergulhei as mãos naquela água límpida e refresquei meu rosto. No chão batido de terra, junto com a água, foram-se todas as minhas tristezas e traumas. De alma limpa e renovada, iria ser novamente uma mulher feliz. E livre.'




CAPÍTULOS DO CONTO - ESCRAVA DA ILUSÃO:



  • Capítulo 1 - Escrava da Ilusão
  • Capítulo 2 - Maria conhece D. Alba
  • Capítulo 3 - A moça embarca para Portugal
  • Capítulo 4 - Maria é recebida com hostilidade em Portugal
  • Capítulo 5 - A dançarina sai com um rapaz
  • Capítulo 6 - Maria foge do pais
  • Capítulo final - Maria volta ao Brasil
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