"A primeira carta que mamãe mandou mexeu comigo. Ela escrevera com a simplicidade do seu português de semianalfabeta, mas com a grandiosidade da sua sabedoria de vida. "Filha, cuidado com o que anda fazendo!", disse, desconfiada de que o dinheiro não vinha somente de apresentações como dançarina. Chorei abraçada àquela correspondência tão preciosa.
Depois de Manoel, comecei a sair com outros homens. Dona Rosa me indicava e eu os acompanhava até um hotel decadente nos arredores da boate. Alguns me ofereciam droga, mas sempre recusei. No entanto, comecei a me sentir outra Maria. Ao permitir que abusassem de meu corpo por dinheiro, deixava minha dignidade e meu amor próprio irem embora. Não era mais a mesma.
Mamãe parou de escrever. Porém, continuei enviando o dinheiro. Rezava para que aquele montante estivesse ajudando meu povo a progredir e a ter uma vida melhor - que a minha, inclusive!
Quando conheci João Victor na boate, achei algo estranho logo de cara. Apesar das roupas caras e do perfume agradável, parecia agitado. "Esse é cheio da grana. Pode cobrar bem!", avisou dona Rosa, ansiosa por seus 50% de comissão. Acertei os detalhes do programa e segui para o hotel.
Assim que entramos no quarto, ele tirou um papelote de droga do bolso. Riu nervosamente, inspirou o pó branco e me agarrou com força. "Calma...", pedi, tentando me safar. Ele me deu um tapa e eu despenquei.
Enquanto me recuperava da agressão, João tentava me abusar. Gritei, mas ninguém veio me socorrer. Ele tentou me beijar e me possuir à força, mas eu o impedi. Com forças que jamais imaginei ter, consegui desferir um chute no meio das pernas dele, que urrou de dor e cambaleou. Peguei sua carteira, tirei o dinheiro e saí correndo. Ainda o ouvi me xingando de todos os palavrões possíveis. E, sobretudo, me jurando de morte!
"Preciso voltar para o Brasil, dona Rosa...", anunciei, naquela noite. A megera me ignorou. Fiquei desesperada, pois meu passaporte estava com ela. Contei o dinheiro que havia tirado da carteira do outro maldito. Era o suficiente para a passagem de volta.
Sem mencionar nada sobre o incidente, avisei dona Rosa que estava doente e que não poderia dançar naquela noite. Ela ficou meio desconfiada, mas me liberou. Assim que todos saíram da casa, comecei a vasculhar todos os cantos atrás de meu documento. Remexi gavetas, armários e depósitos. Finalmente, achei uma caixa. Lá estavam o meu passaporte e os de todas as meninas.
Não havia muito tempo, pois João Victor certamente iria aparecer na boate atrás de mim e tudo seria revelado. Fiz minha mala e saí correndo do alojamento, sem me despedir de ninguém. Peguei um táxi e pedi que me levasse para o bairro do aeroporto. Lá, procurei um hotel barato e me hospedei.
Com medo de colocar o nariz na rua, fui bem disfarçada até uma agência de viagens e comprei a passagem. Na volta, deparei-me com um carro de polícia estacionado na frente do hotel. Senti meu sangue gelar: finalmente, haviam me encontrado! "
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