Maria é caçula de sete irmãos e seus pais sustentam a família com muito esforço. (Capitulo 1)
'Olá, hoje vou contar a minha história. Fui batizada com o nome de Maria por minha mãe ser muito católica. Ela sempre acreditou que ter o nome da mãe de Jesus me traria uma bênção tão poderosa que me protegeria de todo o mal existente. Eu era a caçula de sete irmãos, única menina naquela casa de barro, no sertão do Pernambuco. Não era para eu ter vindo. Sabia disso. Meus pais mal tinham dinheiro para bancar um único filho, mas os "acidentes" aconteceram e a gente foi nascendo, um atrás do outro.
Meus irmãos me ignoravam. Sempre fui uma estranha naquele lugar. Enquanto eles jogavam bola, eu ficava sentada no chão de terra batida da casa brincando com uma boneca velha que meu pai achara num lixão. "Dança, Sheila, dança...", repetia, enquanto fazia piruetas com meu brinquedo de plástico vagabundo. Na minha imaginação, aquela boneca era uma dançarina linda, que encantava plateias mundo afora.
Aos 13 anos, tiraram minha boneca e me colocaram na roça. Assim como meus irmãos, passei a ajudar meus pais na plantação. O sol forte do sertão nos castigava e a fome apertava. Não podia mais brincar. Havia chegado o momento de lutar para sobreviver. Naquele instante deixei de ser criança; ali, perdi minha inocência pela primeira vez.
Todos dormiam quando me levantei naquela madrugada. Um dia antes, colocara roupas limpas num saco plástico. Quietinha, com todo cuidado, saí de casa. Da porta, ainda dei uma última olhada para todos: mamãe, papai e meus três irmãos (os outros três já haviam saído de casa há muito tempo) dormiam profundamente por causa do cansaço na lavoura. Com lágrimas nos olhos, encostei a porta de madeira e prossegui no meio da mata escura. Sabia a direção da estrada de asfalto, mas, de tão nervosa, quase me perdi.
Fiquei sentada próxima ao posto de gasolina. Precisava dar um jeito de ir embora. Morrendo de medo e vergonha, acenei para um caminhão estacionado no posto. Tentei ler a placa, para saber de onde era, mas meu semianalfabetismo não deixou. Ainda assim, quando piscou o farol, fui até ele.
"Maria, cuidado com esses safados que estão por aí...", dizia mamãe sempre que eu tinha de sair do povoado. A frase, naquele momento, martelava minha cabeça de menina de 16 anos a ponto de quase me fazer chorar. Olhei para o velho do caminhão e disse que estava perdida. Que havia fugido de casa, na capital, e agora precisava voltar. Ele achou estranho, mas acabou acreditando e decidiu me levar de volta.
No caminho, Sr. Damião, o motorista, ligou o rádio. Estava tocando um forró animado. Sorri. Adorava aquela música. Sem perceber, comecei a requebrar na boleia. Graças a Deus, o homem não tentou me fazer nenhum mal. Deve ter sentido dó de mim. "Você dança bem, menina!", falou, sorrindo. Agradeci e, mais tranquila, me soltei. Naquele banco gasto me imaginei dançando como a bonequinha que trazia no saco plástico. E senti um presságio de que, um dia, todos os meus sonhos se realizariam, tal qual eu havia imaginado.'
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