Conto: Escrava da ilusão - Capítulo 4 de 7

By | terça-feira, outubro 11, 2011 Leave a Comment
Assim que chegou em sua nova casa, Maria sentiu um aperto no coração e começou a chorar. (Capítulo 4)

'Um gordo de sobrancelhas grossas me esperava no saguão do aeroporto. Tinha na mão uma placa de papelão com meu nome. Cumprimentou-me de cara fechada. "Eu me chamo Benito. Vamos!", disse, seco. 
Fazia um frio desgraçado em Lisboa. Ainda bem que tinha levado um casaco bem grosso. O céu nublado e o ar de poucos amigos daquele desconhecido me deixaram preocupada... e triste. "Será que fiz a coisa certa?", pensei, enquanto olhava ao redor. 
Após 20 minutos, Benito parou na frente de uma casa de pintura descascada, decadente. Tocou a campainha e uma loira apareceu. Ela olhou para o carro, me viu e entregou a ele um envelope. O gorducho me mandou descer; eu nunca mais o veria na vida. 
"Maria, posso ver seu passaporte?", foi a primeira coisa que ela me disse. Entreguei o documento, ainda assustada com tudo aquilo. Ela sorriu. "Vou lhe mostrar seu quarto", murmurou, guardando o passaporte no seu casaco. "Ah, meu nome é Rosa e também sou brasileira...", falou, enquanto subíamos uma escada de madeira velha. 
O cheiro de mofo que imperava naqueles cômodos também reinava em meu novo quarto. Pequeno, com uma minúscula janela e sem tapetes: esse era o lugar onde eu passaria a dormir por tempo indeterminado. 
"Tome um banho e descanse. Vou preparar algo para você comer. Suas colegas de trabalho devem chegar por volta das 21h.Vocês irão juntas para a boate!", falou, duramente. Resolvi tomar alguma atitude. "Dona Rosa, vou dançar de que horas a que horas? É funk, axé, essas coisas...?", perguntei. 
Num sorriso irônico, ela mostrou seus dentes amarelados de nicotina. "Pode-se dizer que sim, menina. Você vai ver na hora...", devolveu. Com muita vergonha, perguntei-lhe sobre o salário que haviam me prometido no Brasil. "Maria, você mal chegou e já quer saber tudo? Calma, filha!", disse, fechando a porta do quarto. 
Agarrei o travesseiro e comecei a chorar. Pensei em mamãe e na minha família passando necessidade no Nordeste. "Vou conseguir, mãinha, vou conseguir...", repeti, até desabar num sono profundo. Despertei com batidas na porta. Dona Rosa entrou de repente, com um prato de sopa. "Jante e desça, pois as meninas já estão te esperando. Ah, não se preocupe com roupa, seu figurino está lá na boate...", falou antes de me dar as costas. 
Devorei a minha primeira refeição em solo europeu: não era gostosa, mas minha fome ignorou isso. Ao descer, vi três garotas. Elas pareciam tristes. "Oi, Maria...", disseram em coro. Pelo sotaque, percebi que eram brasileiras. Aos poucos, me enturmei com Gilda, Rita e Teresa. Assim como eu, vinham de famílias humildes. Pegamos um táxi com Dona Rosa e fomos para a boate Star. 
Lá dentro, muitos espelhos, tapete vermelho e um poste no meio do palco. "É nele que você vai dançar, Maria!", apontou Dona Rosa. "Chama-se pole dance, mas não importa se você não sabe o que é. Apenas segure nele e rebole para nossos clientes!", resumiu. "E esse é seu 'uniforme de trabalho'...", ironizou a malvada, segurando um minúsculo biquíni prateado entre os dedos.'

CAPÍTULOS DO CONTO - ESCRAVA DA ILUSÃO:



  • Capítulo 1 - Escrava da Ilusão
  • Capítulo 2 - Maria conhece D. Alba
  • Capítulo 3 - A moça embarca para Portugal
  • Capítulo 4 - Maria é recebida com hostilidade em Portugal
  • Capítulo 5 - A dançarina sai com um rapaz
  • Capítulo 6 - Maria foge do pais
  • Capítulo final - Maria volta ao Brasil

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